Eixos prioritários de intervenção

Na maioria das viagens existe quase sempre uma componente pedonal, tornando-se desta forma necessário a implementação de uma rede pedonal que permita aos peões a concretização dessas viagens em segurança, comodidade e rapidez. Nas áreas urbanizadas, mais concretamente nos locais onde se desenvolvem a maioria das atividades humanas, é imperativo a existência de passeios com caraterísticas adequadas à carga funcional existente, para que não surjam problemas de circulação e seja possível a realização dessas atividades.

A fase de Caracterização e Diagnóstico permitiu identificar algumas tipologias de barreiras a uma acessibilidade universal que deverão ser minimizadas, nomeadamente:

  • Indefinição, ausência e subdimensionamento dos passeios;
  • Existência de pavimento irregular e degradado;
  • Ausência/indevida execução de passadeiras e respetivos rebaixamentos de passeios;
  • Existência de estacionamento abusivo e ilegal;
  • Outras barreiras arquitetónicas/urbanísticas a interromper o percurso pedonal, tais como árvores, degraus/escadas, candeeiros ou postes de iluminação.

Tendo em consideração que o nível de detalhe de um Plano de Mobilidade não é muito aprofundado e foram encontradas deficiências na fase de diagnóstico, sugere-se a revisão de todos os passeios, verificando a existência de uma acessibilidade universal, promovendo uma maior continuidade e homogeneidade dos mesmos e respeitando as larguras mínimas (1,20 metros), colocando o mobiliário urbano no que se designa por “canal de infraestruturas” (Decreto-Lei n.o 163/2006, de 8 de agosto). A Figura 3 apresenta os principais critérios de qualidade a respeitar no planeamento da rede pedonal. Já a Figura 4 apresenta alguns exemplos de aplicação do Decreto-Lei supracitado.

Figura 3

Figura 3 | Principais critérios de qualidade a respeitar no planeamento da rede pedonal (IMTT, 2011). Fonte: Adaptação IMTT, 2011.

Figura 4

Figura 4 | Alguns exemplos de aplicação do Decreto-Lei n.o 163/2006 de 8 de agosto, com vista à aplicação de uma acessibilidade universal. Fonte: Teles, 2014.

Sempre que possível, recomenda-se a adoção de larguras superiores, de forma a permitir a criação de canais mais confortáveis e capazes de se adaptarem a novas realidades e exigências de desenho urbano. O pavimento dos passeios deve ser estável, confortável, durável, contínuo e com superfície de refletância média. Quando as barreiras urbanísticas e arquitetónicas impossibilitarem uma largura livre do passeio de 1,20 metros, propõe-se a deslocação das mesmas para locais adequados ou, eventualmente, a sua total remoção. Em todos os novos passeios devem ser implementados pisos tácteis para invisuais, especialmente nas passagens de peões.

Para ser possível estabelecer prioridades na revitalização dos passeios, optou-se pela definição de linhas de desejo pedonais, metodologia que será descrita em seguida.

A rede pedonal da cidade de Faro é dinamizada por diversos polos geradores de viagens, tais como serviços públicos, equipamentos de utilização pública, grandes áreas comerciais, estação ferroviária ou o terminal rodoviário, de onde saem ou para onde são atraídos peões.

As deslocações diárias entre os diversos polos geram importantes fluxos pedonais, muitos deles bem definidos pela estrutura viária existente e morfologia do território e outros ainda que, apesar de não assumidos em termos formais, funcionam como importantes eixos pedonais. Aliás, estes últimos surgem até em terrenos não ocupados, onde a circulação pedonal diária define percursos pedonais “informais” que interligam os destinos de desejo.

Os percursos entre os diversos polos, independentemente de gerarem fluxos efetivos de peões, concentram um grande potencial de fluxos, podendo-se designar por linhas de desejo pedonais. Este potencial pedonal terá que ser previsto em futuras intervenções, devendo ser equacionadas medidas de melhoria de acessibilidade e mobilidade pedonal nestes locais. Este é um processo que deverá ser contínuo e estar em constante evolução, sendo ajustado às necessidades e procura de deslocações pedonais neste território.

A figura seguinte reflete as linhas de desejo pedonais, as quais respondem à necessidade de interligação de importantes polos geradores de fluxo pedonal na cidade de Faro e áreas urbanas adjacentes. A título de exemplo citam-se as interfaces de transportes, as grandes áreas comerciais como “Fórum Algarve”, equipamentos ou serviços públicos e pontos de interesse turístico como a zona histórica de Faro.

Estes percursos de desejo não estabelecem valores de procura, mas sim percursos com elevado potencial de se realizarem no modo pedonal, entre os 195 equipamentos estruturantes identificados no perímetro urbano, tendo em consideração os tempos mínimos, que por sua vez consideram as distâncias mínimas e os declives existentes. Parte destes eixos, são simultaneamente utilizados pelo peão para aceder a mais do que um equipamento.

Estas linhas de desejo foram definidas com recurso ao software ArcGis (por uma questão de coerência de propostas, nomeadamente as referentes à pedonalização de certas zonas da cidade, foram acrescentadas algumas vias em relação às identificadas pelo software, sendo que algumas destas já se encontram previstas no Plano de Ação de Regeneração Urbana de Faro - PARU).

Figura 5

Figura 5 | Eixos prioritários – linhas de desejo pedonal. Fonte: mpt®, 2016.

Estas linhas de desejo pedonais encontram-se divididas em duas fases de priorização.

Eixo de prioridade 1

Constituem percursos pedonais comuns às várias ligações possíveis entre equipamentos estruturantes. Pelas várias ligações que possibilitam são percursos com maior potencial de deslocações pedonais, sendo, portanto, os que apresentam um maior nível de prioridade para a revitalização dos passeios. Desta forma, são designados por eixos de prioridade 1. Nestes, a grande densidade de equipamentos contribui de forma direta para uma maior atratividade de deslocações.

Estes eixos permitem, nomeadamente, ligações turísticas (Ilha de Faro, Núcleo Histórico Vila Adentro, Parque Ribeirinho, praças e jardins), comerciais (Fórum Algarve), equipamentos de ensino (Universidade do Algarve, Escolas Secundárias, Colégios) e outros equipamentos e serviços públicos (Câmara Municipal, Hospital, Mercado Municipal, Teatro, Tribunal, Bombeiros, Estação Ferroviária e Terminal Rodoviário).

Figura 6

Figura 6 | Eixos prioritários 1. Fonte: mpt®, 2016.

Eixo de prioridade 2

Estes percursos, embora não permitam a multiplicidade de ligações descritas no eixo 1, constituem-se igualmente como importantes ligações entre equipamentos. A prioridade 2 engloba uma série de eixos viários, também importantes, que permitem a ligação entre diversos equipamentos e serviços, bem como ligações consideradas relevantes, quer pelos núcleos populacionais abrangidos, quer pelo tipo de equipamento ou serviço a que este eixo (im)possibilita o acesso.

Nestes eixos estão localizados, entre outros, os seguintes equipamentos: Segurança Social, pousada de juventude, A.A.P.A.C.D.M., GNR, junta da freguesia, doca de recreio, centro de saúde, AMAL, escola básica, jardim-de-infância, pavilhão desportivo, campo de futebol e piscinas municipais.

Figura 7

Figura 7 | Eixos prioritários 2. Fonte: mpt®, 2016.

A definição de uma boa rede pedonal que interligue os principais polos geradores poderá potenciar grandes mudanças na vivência e dinâmicas da cidade e zonas adjacentes. O facto de existirem passeios largos e confortáveis e passadeiras acessíveis, atrai mais deslocações pedonais, reduzindo-se a necessidade do uso de modos motorizados, o que potencia a redução de emissores poluentes.

Para a revitalização das vias, propõe-se a adoção de cinco perfis-tipo, definidos de acordo com os princípios e normas legais em vigor, capazes de se adaptarem à cidade de Faro.

De salientar, o facto de serem, como se refere, perfis-tipo. A sua adoção obriga, como é evidente, a uma interpretação à luz da dimensão da rua onde se vai intervir, ponderando as especificidades do desenho de cada rua, de forma a manter o percurso acessível. Estes perfis-tipo são balizados por intervalos de distâncias.

Ruas com perfil inferior a 5,15 metros – perfil-tipo 1

Na cidade de Faro, nomeadamente no Centro Histórico, o perfil das vias situa-se, algumas vezes, abaixo dos 5,15 metros de largura. Nestes arruamentos (onde é autorizada a circulação viária) propõe-se o redesenho da via, com a adoção de uma tipologia de via partilhada e à mesma cota, com um percurso pedonal central de largura mínima de 1,20 metros. Este canal é diferenciado pela utilização de material distinto e deve garantir uniformidade, conforto e ser antiderrapante. Esta via deve estar devidamente assinalada como via partilhada com prioridade ao peão. Resumindo, o peão pode circular no centro da rua, tendo prioridade em toda a extensão da mesma.

Figura 8

Figura 8 | Exemplo perfil-tipo 1. Fonte: mpt®, 2016.

Ruas com perfil entre 5,15 e 5,40 metros – perfil-tipo 2

No segundo perfil-tipo, optou-se por definir corredores laterais de, pelo menos, 1,20 metros de largura, em material confortável para a circulação pedonal. Apesar do nivelamento do pavimento que se propõe para este perfil, é efetuada a diferenciação entre as áreas de circulação automóvel e o fluxo pedonal, através da utilização de materiais distintos. Salienta-se que, uma vez mais, as ruas deverão ter um carácter partilhado, com prioridade para o peão.

Como tal, em ruas cujo perfil é inferior às medidas referidas, e uma vez que não faz sentido existir passeio apenas de um dos lados, julga-se mais sensata a opção pelo perfil-tipo 1.

Figura 9

Figura 9 | Exemplo perfil-tipo 2. Fonte: mpt®, 2016.

A natureza destas ruas – vias partilhadas com prioridade ao peão – permite o atravessamento em qualquer ponto da sua extensão, existindo sempre prioridade de circulação pedonal em relação aos veículos automóveis. Devido a esta situação, com a reformulação das vias para ruas de perfil-tipo 1 ou 2, não se aplica a existência de passagens de peões restritas a um determinado local.

Tratando-se de perfis de rua mais estreitos, recomenda-se que o mobiliário urbano seja colocado de forma a não interromper o percurso pedonal acessível, como algumas vezes acontece com os candeeiros de iluminação pública, placas toponímicas ou sinais de trânsito. Assim, recomenda-se que, quando não existe espaço suficiente no percurso pedonal para a sua localização, ou seja, quando não é possível garantir uma largura mínima do passeio de 1,20 metros, este tipo de elementos seja afixado nas fachadas dos edifícios ou muros, libertando deste modo o corredor pedonal.

Ruas com perfil entre 5,40 e 8,40 metros – perfil-tipo 3

Figura 10

Figura 10 | Exemplo perfil-tipo 3. Fonte: mpt®, 2016.

Ruas com perfil entre 8,40 e 9,60 metros – perfil-tipo 4

Nas ruas cujo perfil se situa entre 8,40 e 9,60 metros, surge a possibilidade da existência de passeios em ambos os lados da via e duas vias de rodagem para automóveis com 3,00 metros de largura, sendo que se se mantiver este valor e o perfil se aproximar dos 9,60 metros, é possível ter passeios com dimensões superiores aos mínimos exigidos.

A partir dos 9,60 metros existem várias possibilidades, sendo que este valor de referência surge devido ao facto de se somar aos 8,40 metros de largura mais 1,20 metros, correspondentes a uma possível ilha central.

A referência à ilha central resulta do enquadramento que esta merece na legislação específica de Acessibilidade e Mobilidade para Todos (é uma forma do peão esperar em segurança pelo atravessamento) e pelo facto de ser uma opção constante nas ruas centrais e mais recentes de muitas das cidades portuguesas. Assim, considerando a possibilidade de se contemplar a existência de uma ilha central, o valor de 9,60 metros estabelece o mínimo para ser possível a adoção desta solução.

Figura 11

Figura 11 | Exemplo perfil-tipo 4. Fonte: mpt®, 2016.

Ruas com perfil superior a 9,60 metros – perfil-tipo 5

O perfil-tipo 5 caracteriza-se por apresentar uma largura superior a 9,60 metros, o que possibilita inúmeras opções em termos de desenho urbano. A figura seguinte, apresenta ilustrações-tipo do perfil-tipo 5. A rua apresenta-se com dois sentidos para o tráfego automóvel e passeios laterais em ambos os lados. Existe ainda a possibilidade de haver uma zona reservada a estacionamento.

Figura 12

Figura 12 | Exemplo perfil-tipo 5. Fonte: mpt®, 2016.